quinta-feira, 5 de abril de 2012

TURISMO CVC "SONHE COM O MUNDO, QUE A GENTE LEVA VOCÊ PARA O TRIBUNAL"


CVC, um exemplo de preconceito e discriminação no turismo BRASILEIRO
Este documento é uma cópia do documento original da ação contendo uma descrição resumida da problemática envolvida.

Minha primeira viagem internacional após ter adquirido minha deficiência, e a primeira vez que iria visitar a Europa. Era realmente um sonho a ser realizado. Para isso, pensei em procurar auxílio, por certa insegurança em enfrentar barreiras num local desconhecido e também por uma questão de conforto, pois não tinha tempo suficiente para planejar essa viagem sozinho devido ao meu trabalho, pensei em procurar uma agência de grande porte, pois pensava que tendo uma estrutura maior, estaria mais preparada para me atender. Ainda tinha dúvidas em qual roteiro escolher, então fui pessoalmente até uma das agências da CVC no Shopping Santa Cruz em São Paulo, pedir mais informações e ouvir algumas opiniões do atendente. Algumas horas e diversas perguntas depois cheguei a uma decisão, escolhendo um roteiro que compreendia Portugal, Espanha, França e Inglaterra num pacote de 27 dias, que se iniciaria no final de julho até meados de agosto. Somente algumas dúvidas por parte do atendente, como por exemplo, em relação à hospedagem, e eu dizia que não haveria problema, se o local tivesse acessibilidade eu saberia me cuidar sozinho sem a ajuda de ninguém. Ele me garantiu que não haveria problema, então foi marcado o dia e o horário do embarque. Ele foi arrumar a documentação, mas após um espaço de tempo veio me informar, que estava com um pequeno problema e que não poderia me fornecer o contrato naquele momento, e que o mesmo seria enviado a minha residência através de um motoboy.

            Na minha ingenuidade, não vi nada demais, então retornei à minha casa para já ir pensando nas coisas que iria levar, pensando nos lugares que iria visitar, enquanto aguardava a entrega do contrato. O tempo foi passando, e a uma semana do embarque, resolvi me dirigir novamente a agência para verificar o que estava ocorrendo. Chegando ao local, disse que já estava totalmente preparado para viajar, tanto materialmente como psicologicamente, mas estava preocupado, pois o contrato ainda não tinha sido entregue como prometido, e por isso ainda não tinha pagado pelo serviço. Perguntei se estava tudo bem, pois viajar sem pagar não era o problema, mas queria ter certeza de que tudo estava bem, como acordado inicialmente.
            Foi quando ouvi uma das respostas mais fortes de minha vida: “Senhor, me desculpe. Infelizmente como você irá dar muito trabalho a nós, então se quiser ir viajar, terá obrigatoriamente que arranjar um acompanhante!”. Essas palavras doeram mais que um soco de Mike Tyson. Uma mistura de susto e raiva tomou conta de mim, e então comecei a elevar minha voz indignado e pedindo explicações, afinal se eles não teriam condições de me levar, isso deveria que ser informado no momento em que fui pedir informações, e não quase às vésperas do embarque. Porém, via uma expressão de “sinto muito” na face desse atendente, que parecia não compreender a gravidade daquilo que estava fazendo. Foi uma desilusão enorme, pois não estava saindo no período de minhas férias inteira, economizando o dinheiro para gastar em minha viagem.
            Depois de me recuperar desse acontecimento, pensei que teria que fazer algo, pois isso me feria por diversos lados. Pessoalmente, pois estragou a realização de um grande sonho, e profissionalmente, pois já era bem envolvido em trabalhar as questões do turismo acessível, então estava decidido a fazer algo para não deixar isso passar em branco. Decidi procurar um advogado, e acabei entrando em contato com Roberto Bolonhini Júnior, um advogado cego que também lutava pelo direito das pessoas com deficiência. Após uma conversa, ele me explicou que, como eu não tinha nenhuma prova, pois me foi dado somente um orçamento da viagem, e também não tinha uma testemunha, pois todas as etapas estavam sendo vistas pessoalmente por mim, pois iria viajar sem nenhum acompanhante, então seria difícil mover um processo, pois seria minha palavra contra a deles.
            Mesmo assim não queria desistir. Então resolvi entrar com uma ação no Juizado Especial Cível, onde não teria gastos com as questões de auxílio judicial, e onde geralmente os casos se resolvem em um espaço de tempo mais curto, embora a quantia de dinheiro a ser requerida tenha um limite máximo 40 salários mínimos. Juizado Especial Cível é conhecido popularmente como Juizado de Pequenas Causas, porém considero o fato ocorrido comigo mais um acontecimento especial e não uma pequena causa. Primeiro há uma primeira audiência, onde é tentado um acordo entre as duas partes. Caso não cheguem a nenhum resultado, é marcada uma segunda audiência, onde a decisão cabe ao Juiz. E foi o rumo que meu caso tomou.
            Nesta segunda audiência, o Juiz olhando rapidamente as informações fornecidas a ele, disse que teria que precisaria de mais dados concretos para ter uma base mais sólida e assim tomar uma decisão justa. Então ele nos disse que naquele momento, iria ligar para quatro agências da rede CVC escolhidas por mim, e se passar por um cliente com as mesmas características que eu, paraplégico usuário de cadeira de rodas, um turista sem acompanhante, buscando um pacote para Portugal, Espanha, França e Inglaterra, pedindo informações e principalmente verificando se a agência, que tem procedimentos e atendimentos padrão em toda a rede, confirmaria minha viagem com todas essas minhas características. A atendente da primeira agência ficou em dúvida, e apesar de achar que não haveria problema, disse que precisaria confirmar essa informação com seu gerente. Porém, nas três agências seguintes, as atendentes afirmaram que não haveria nenhum problema apesar das características apresentadas, e o juiz fez questão de repetir tais características mais de uma vez e pedir novamente a confirmação, para que não houvesse a desculpa de uma falha compreensão por parte do atendente. Diante desses fatos, o Juiz concluiu que a empresa não tem cuidado ao atender pessoas com deficiência, gerando expectativas e até confirmando a viabilidade da viagem, mas depois proibindo que esta pessoa a realize. Ou seja, um inaceitável exemplo de danos morais, sem contar outras questões em que esse caso poderia se enquadrar, como preconceito, discriminação, e outras atitudes condenadas na legislação brasileira e até mesmo em documentos internacionais.
            Foi dado ganho de causa a mim, porém a maior vitória foi mostrar, representando as pessoas com deficiência que somos pessoas fortes, e exigimos que sejamos tratados com dignidade. O incidente não modificou em nada o pensamento da rede CVC, pois sei que este assunto nem saiu da filial do Shopping Santa Cruz e não chegou aos ouvidos das pessoas de decisão da empresa. Em eventos que encontro a CVC expondo, costumo questionar, como se fosse uma pessoa desinformada, se eles me levariam para viajar numa bela excursão para Europa, e até hoje os atendentes insistem em dizer que estão preparados para me levar.
            As explicações da gerência da agência, era que eles estavam pensando no meu bem, queriam que eu me sentisse confortável e que não tivesse nenhum tipo de problema na viagem. Mas a agência não tem como dizer o que é bom para mim ou não, pois a única pessoa que conhece minhas dificuldades ou capacidades sou eu, e eles só podem me dar conselhos. Ouvindo essa explicação, tive a certeza que estavam pensando no bem deles, pois preconceituosamente pensavam que minha presença iria trazer desconforto e problemas a eles. Seguindo a linha de pensamento da ONU, referente aos direitos das pessoas com deficiência, deficiente é o estabelecimento, que não tem capacidade para levar uma pessoa com deficiência através do serviço que oferecem.
            Hilário ainda, é o slogan que a empresa utiliza: “Sonhe com o mundo. A gente leva você”, pois o único lugar que me levaram foi ao tribunal. Algum tempo depois, realizei esse sonho sem ajuda de ninguém, pois percebi que agências despreparadas, ao invés de me auxiliar, só iriam me trazer mais complicações. Fiz o mesmo roteiro que havia escolhido na agência, que inclui Portugal, Espanha, França e Inglaterra, e realizei todos os procedimentos de uma empresa no agenciamento de um turista. Pesquisei hospedagens adaptadas, atrativos turísticos acessíveis, transporte, câmbio, seguro, enfim tudo. Foi um grande aprendizado que serviu para minha valorização pessoal e profissional, pois consegui fazer sozinho o que uma agência desse porte nem teve coragem em tentar, serviu também para mostrar ao mercado turístico e às próprias pessoas com deficiência, que o prazer de viajar é possível a todos.

CUIDADO! ANTES DE VIAJAR! PESQUISE MUITO PARA NÃO CAIR NUMA FRIA COMO ESSA QUE A CVC APRONTOU COM UM TURISTA!

2 comentários:

  1. Mais uma matéria inteligente.... Rsrsr, adoramos vamos aguardar as postagens , que procavelmete irão passar das 50

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  2. 70 MIL VISITAS, DESCULPE AI ALESSANDRO

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